O CASAMENTO FOI NULO? - NINGUÉM É BOBO
A Demandante JULIETA casou-se com o Demandado ROMEU no dia 15
de Dezembro de 1973. Ela contava, então, 27 anos e ele 25 anos. Convieram durante
22 anos e tiveram duas filhas.
A fixação das dúvidas foi:
1-
Por
simulação total do casamento por parte do Demandado (cân. 1101, 2).
2-
Por
simulação parcial do casamento por exclusão da fidelidade da parte do Demandado
(cân. 1101, 2).
1.- A Demandante descobre, após trinta anos, que o Demandado,
seu marido, simulou o casamento, isto é, mentiu ao padre que testemunhava
oficialmente o ato em nome da Igreja, dizendo que queria casar com a Demandante
e, em consciência, não queria casar com ela.
A primeira reação de um juiz será: só agora é que descobriu
que o Demandado não quis casar com ela? Se o Demandado não queria casar quem o
obrigou a ter duas filhas e conviver com ela por 22 anos sem se separarem? Se o Demandado não quis casar com a
Demandante, ele é que a deveria ter abandonado, e foi ela que saiu de casa e o
deixou com as filhas.
Embora não haja dúvidas de que se trata de um motivo forjado,
contudo, há que confirmar a verdade ouvindo o Demandado.
Chamado a depor em Tribunal o Demandado afirma:
-“Eu me apaixonei pela Demandante, observei que era de boa
família, que seria uma boa moça para me casar” (fol.60,3);
-“Havia entre nós um verdadeiro amor conjugal e ainda diálogo
antes e depois do casamento” ((fol.60,15);
-“O nosso amor era um amor invejável por todos, era muito
bonito e sempre andávamos de mãos dadas; eu nunca amei uma mulher como eu amei
a Demandante; no momento do casamento eu tinha consciência e capacidade para
viver a unidade e indissolubilidade do matrimônio cristão” (fol.61,16);
-“O casamento na Igreja foi um ato de livre e espontânea
vontade nossa e não houve nenhum fato ou situação que nos pressionou a nos
casar” (fol. 60, 10).
Portanto, não restam dúvidas de que o Demandado não simulou o
contrato de casamento que incluía o famoso “até que a morte vos separe”.
2 - A Demandante alega ainda no processo que o Demandado
excluiu do contrato de casamento a observância da fidelidade conjugal.
A quem alega cabe o ônus de provar o que afirma. Ora as
provas alegadas não têm amparo jurídico porque se referem à infidelidade após o
casamento, com a conclusão leviana de que quem traiu depois, traiu antes; ou
quem trai uma vez, trai sempre. Essa permissa maior não é verdadeira e, por
isso, suas conclusões podem ser falsas, precisando de provas concretas e não de
simples pareceres ou “disse-me, disse-me”, de vizinhos.
Na apresentação de provas tenta a Demandante ludibriar os
juízes com uma “Relação de saídas do Sr. Romeu 2001/2002”. Mesmo que verdade
fosse que no “dia 4 de agosto do ano 2001, (o marido) saiu de manhã e voltou a
casa no dia 5 à noite” e que “no dia 10 de agosto saiu de madrugada e voltou no
dia 12 às 11h 15 min A.M.” (fol. 4), etc., etc... (são 24 anotações com dia,
hora e minutos apontados), esses pormenores não impressionariam os juízes porque
estes sabem muito bem que na relação não está comprovada a traição e, mesmo que
estivesse, tratar-se-ia de acontecimentos posteriores ao casamento que nada têm a ver com o consentimento dado em
1983, isto é, que o Demandado no ato do casamento já tinha intenção de, 18 anos
depois, não obedecer ao preceito da Igreja de ser fiel à esposa.
Sabe-se que o casamento na Igreja católica é por toda a vida,
tanto na saúde quanto na doença, tanto na fidelidade quanto na traição”, isto
para o bem e segurança de toda a família. Cada uma das partes precisa conhecer
muito bem a outra antes de assumir esse compromisso por toda a vida. Se as
coisas não estão bem definidas, ou bastante claras, é melhor não casar ou fazê-lo
só no civil quando os convites estão na rua e não se tem como voltar atrás.
Entre dois males, escolha-se o menor. O homem e a mulher foram criados por Deus
para serem felizes a vida toda, mas essa felicidade depende da liberdade da
escolha de cada um.
Ora, uma vez que a Demandante e suas testemunhas não
trouxeram uma prova concreta e segura da exclusão da fidelidade por parte do
Demandado, pois “ver o demandado com outra mulher na rua” (fol.56,6 - Edna) não
configura a traição, e para desencargo de consciência e também atendendo ao
direito de defesa, os juízes não poderiam concluir sem ouvir a parte Demandada.
Chamado a juízo este confessou que antes do casamento nunca
traiu a Demandante nem era sua intenção excluir a fidelidade:
-“Posso afirmar que não houve traições antes da celebração do
casamento” (fol. 60,8);
-“Na intimidade nós nos mostrávamos interessados em ter uma
vida sexual saudável e fiel um com o outro” (fol. 61, 17);
-“Vivíamos em harmonia até o nascimento de nossas filhas...
só depois é que tivemos dificuldades financeiras e, com isso, se iniciaram os
primeiros problemas” (fol. 61,18)... a partir daí, “a Demandante estava
gastando o dinheiro com outras coisas sem me prestar contas, e passei a beber e
a gastar parte do meu dinheiro com bebidas e mulheres” (fol. 61, 19).
Portanto, conclui-se que a infidelidade não nasceu da
exclusão do Demandado no ato sacramental do matrimônio mas surgiu como
consequência dos desentendimentos do casal por dificuldades financeiras quando
o amor já estava bastante desgastado. Não ficou provado nos autos nem a
simulação total do casamento, nem a exclusão do compromisso de fidelidade por
parte do Demandado.
É muito frequente o ponto inicial da separação do casal
coincidir com os desentendimentos por questões financeiras. Diz o nosso povo
que em casa de quem não tem pão todo o mundo briga e ninguém tem razão.
Na causa em apreço, trata-se apenas duma pretensão intempestiva
da Demandante para justificar, perante a sociedade, o modo de vida que leva em
coabitação com um Sr. de oitenta anos. Ora este Sr., aos 80 anos, não precisa
dela como esposa para constituir uma nova família, mas como acompanhante e
empregada... e para isso, ainda não há lei que obrigue a serem casados.
VOTOS DOS JUIZES:
1-
NEGATIVAMENTE
Por simulação total do casamento por parte do Demandado (cân. 1101, 2).
2-
NEGATIVAMENTE
Por simulação parcial do casamento por exclusão da fidelidade da parte do
Demandado (cân. 1101, 2).
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Pe. Abílio Soares de Vasconcelos