quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

EXCLUSÃO DOS FILHOS NÃO COLOU


MENTIRA 

TEM PERNA CURTA



TRIBUNAL ECLESIÁSTICO REGIONAL DO RIO DE JANEIRO

   
AAAAA, Demandante, casou-se com BBBBB, parte Demandada, no Santuário da Medalha Milagrosa, Arquidiocese do Rio de Janeiro, em 2009. No mesmo dia casaram-se civilmente. Conviveram por quase dois anos e não tiveram filhos
O Demandante deu entrada no processo de declaração de nulidade deste casamento pelo seguinte motivo:
- Simulação parcial do consentimento matrimonial por exclusão do bonum prolis por parte do Demandante (can. 1101, 1)

Ora, para que se comprove verdadeiramente que o Demandante, ou a parte Demandada, excluiu os filhos é necessário que já antes do casamento tenha manifestado a pessoas da intimidade esse desejo de os excluir, ou tenha deixado algum documento comprovativo de que esse era seu desejo. Chama-se a isso prova em tempo insuspeito.
Quando a parte Demandante procura o Tribunal alegando que queria ter filhos mas não os teve porque a outra parte os excluiu e suas tentativas foram em vão para que os aceitasse, podemos dizer que existe fumus boni juris. A parte Demandante tem direito aos filhos, a outra parte tem obrigação de fazer por onde. Se sempre os evita, e como a paciência tem limites de espera, o processo pode ser iniciado para que as alegações possam ser averiguadas e comprovadas de modo ordinário. Porém, quando a Parte Demandante diz que ela mesma simulou porque queria casar, mas não queria ter filhos, e ninguém mais sabia dessa sua vontade, nem mesmo a parte Demandada, pode tratar-se de uma desculpa de “mau pagador” para tentar resolver problemas ocultos.

No caso em julgamento, AAAA e BBBB conheceram-se quando ele formou uma banda em que ela veio a ser vocalista. Iniciaram um namoro que durou três anos, e, após o mesmo, ficaram noivos por um ano e três meses. Neste período de namoro e noivado o clima era bom.
Após o casamento, viajaram para a lua de mel, onde houve a consumação matrimonial, sem dificuldades.
Após o retorno da lua de mel, ocorreram os primeiros desentendimentos. AAAA fala do namoro e seu intento de não ter filhos:
-"Nosso relacionamento transcorreu normalmente, um namoro em que inexistiam brigas e discordâncias"
- "Demonstrávamos atitudes de respeito, carinho e amizade recíprocos
- "Já quando voltamos da lua de meios primeiros desentendimentos começaram a acontecer em razão de eu não querer ter filhos ao contrário da Demandada que os queria” 
- "Depois do casamento, eu quis o mais claramente possível demonstrar à Demandada que eu não tinha vontade de ser pai". "Eu decididamente não queria ter filhos"
- "O assunto de filhos não era tratado por mim com honestidade. Quando o assunto sobre filhos era iniciado, eu desconversava. Passei a deixar clara a minha opinião quando retomamos da viagem, o que gerou diversos desentendimentos e discussões entre nós
- "Com o tempo nos afastamos totalmente um do outro, mesmo morando no mesmo apartamento"; "as discussões se agravaram durante o ano de 2010 e no término do mesmo, já não tínhamos intimidade como casal"; "não tivemos filhos".

Que provas de suas afirmações o Demandante traz ao processo? Vejamos:
- A Demandada diz: "Casamo-nos porque nós nos gostávamos e livremente, assim contraímos o matrimônio" .... "Posso dizer ... que o casamento fracassou também pelo fato de o Demandante não querer ter filhos" .
- O próprio Demandante diz que não contou a ninguém: "Jamais comentei com quem quer que seja meu propósito de não querer ter filhos”.
Ora, se o Demandante não contou aos amigos que iria excluir os filhos, ninguém pode afirmar que sabia:
1- PPPP, amigo, componente da banda do Demandante e padrinho do casamento, diz:
-  «As partes demonstravam 'carinho, respeito e amizade e estavam sempre juntas". "Posso dizer que durante o casamento, Demandante e Demandada eram amigos, companheiros". "o sei dizer se Alessi, comentou com alguém que não queria ter filhos, comigo jamais surgiu tal tipo de comentário". "Não tiveram filhos. Desconheço as razões pelas quais não os tiveram» .
2- MMMM, mãe do Demandante, diz:
- "Para mim as partes sempre estavam muito bem e assim posso concluir que havia entre elas carinho, respeito e amizade". AAAA jamais comentou comigo a respeito do fato de não querer ter filhos". “Não tiveram filhos. O Demandante o comentava comigo a respeito de ter ou não ter filhos".
3- TTTT, irmã do Demandante, conta:
- "Sempre soube que o Demandante e a Demandada viviam em perfeita harmonia, sem brigas e desentendimentos" ..... "Nunca escutei do meu irmão que ele não queria ter filhos; nem sei, também, se teria ele comentou isso com alguém". "Após a separação, fiquei sabendo que meu irmão o queria ter filhos"                                                                 

CONCLUSÃO

Há um brocardo jurídico que diz gratie afirmantur, gratie negantur. O Demandante diz que excluiu os filhos, mas diz também que nunca revelou isso a ninguém, e as testemunhas confirmam que não souberam dessa sua intenção a não ser depois de desfeito o casamento. Portanto, tempo suspeito, em área de interesse.
A Demandada, a quem o Demandante revelou seu intento depois de voltarem da lua de mel, diz que esse foi também um dos motivos da separação. Foi também um dos motivos. Não diz tão pouco que esse foi o principal motivo.
Portanto, ainda estão em tempo de voltarem ao convívio conjugal, ter muitos filhos e serem felizes para sempre; ou, então, a parte Demandada que se mova e diga que seu casamento foi nulo porque, apesar do seu esforço de vários anos, não conseguiu fazer com que o Demandante evitasse a concepção dos filhos.

Isto posto, voto NEGATIVAMENTE ao capítulo alegado. Mantenha-se a validade do casamento.


Rio de Janeiro,  de 2014
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Pe Abílio Soares de Vasconcelos, juiz

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